Há três anos foi a Lisboa passar as férias. Conheci muitos lugares históricos: igrejas, castelos, santuários... Fiquei muito impressionado com o primor com que os portugueses preservam seu patrimônio histórico. É um país muito bonito. A noite de Lisboa é fantástica. Nos lugares onde estive ouvi muito rock inglês, bandas que não conhecia... De volta ao Brasil, folheei uma revista literária chamada Babel, e lendo alguns poemas de Langston Hughes, dedilhei alguns acordes no violão. Algumas frases vieram espontâneas, sem muito nexo... Não sei explicar, sei que a música saiu de forma impulsiva, por conta das lembranças... Muitos meses depois contatei o Francisco Pupo para copiar a partitura e o Eluílson Aureliano, do Estúdio Guidon. Ele chamou o André Gonzáles (baterista da Banda SuperOver Drive) e o Ronaldo de Oliveira (baixista), e fizemos os arranjos no próprio estúdio. O Eluílson Aureliano trouxe um solo guitarra e uns acordes no teclado. Quando fui colocar a voz, após quatro tentativas eu não estava satisfeito. Sugeri ao técnico Edmilson Aureliano que aumentasse um tom de todo instrumental. Cantei mais afinado e a voz ficou melhor... Parece que o rock que ouvi na nigth de Lisboa influenciou muito...
< voltarouvirletrapartitura
Estava especialmente interessado em passar para a música algo que refletisse a Nova Ordem mundial, pós-guerra fria. Os expurgos comunistas, as perseguições aos artistas, a arte. a religião. Foi uma música que veio Inteira, em poucos minutos. Depois de pronta, achei curiosa a semelhança entre determinadas situações: "comunistas no seu cais", tanto expressam a fuga dos chineses para Hong Kong, quando se refere a cidade de Santos no pré-64. Em ambos os casos, a ideologia dividida dos homens. Ambas as cidades localizam-se numa Ilha havendo uma coincidência, uma irmandade, um ambiente de Isolamento. Gosto dela porque trouxe um assunto inusitado num ritmo de axé-music. Lembro-me que pedi ao Edmilson" que acentuasse a percussão.
Mostra a possibilidade de usar um ritmo bem popular numa letra truncada, densa, cheia de imagens, que era a forma como os tropicalistas viam as canções. Em "Pra Chinês Ver" eu acompanhei o processo da feitura do encarte. Fiz a colagem do dragão chinês puxando a torre do Londres de dentro d'água. Não sabia que estava sendo profético.
< voltarouvirletrapartitura
Essa música (em muito a ver com a influência do Djavan. Depois de Rita Lee e Caetano Veloso, acreditava que ninguém mais traria uma contribuição tao rica ou que influenciasse meu modo de compor. Coração de Cristal tem a influência dele e do que ele fez pela canção do Brasil. Assemelha-se na métrica e no tema. Algo que eu já linha feito de outra maneira em "Saturday, Never More".
< voltarouvirletrapartitura
Eu passei a infância ouvindo samba. Em frente ao bar dos meus pais no Morro do Sao Bento, ensaiava um grupo de rapazes que viriam formar a bateria da Escola de Samba Unidos dos Morros. Meu irmão mais velho, que tocava "surdão" nessa época, estava entre eles. Todos os sábados bebiam cerveja e ensaiavam à porta de casa. Lembro-me que eu, ainda criança, fui com minha mãe ver meu irmão desfilar no carnaval.
Era o único "branco" na bateria da Escola. Minha relação com o samba era essa. Eu não compunha ainda. Sequer tocava algum instrumento. Ouvia o rock do Fruto Proibido, que era estranhíssimo naquele ambiente. Muitos anos depois, quando compus essa música precisava afirmar minha origem. Dizer a mim mesmo que o Samba também cabia na minha composição e a minha historia pessoal cabia nele.
Como essa passagem estava nítida na minha memória, quando entrei no estúdio para gravar "Samba sem Refrão", convidei meu irmão para tocar cavaquinho. Ele ficou lisonjeado, mas na minha cabeça, não podia ser mais ninguém, exceto ele.
< voltarouvirletrapartitura
Eu estava muito impressionado com o livro As Útimas Palavras do Herege do jornalista francês Jean Duflot, que traz uma longa entrevista com Píer Paolo Pasolini. Sempre gostei dos filmes de Pasolini e na entrevista ele contava a perseguição que sofreu. Entao, resolvi fazer uma música sobre esse "amor diferente".
< voltarouvirletrapartitura
Fiz pra Claudinha, uma menina que gostei. No meio da música pintou o lance de falar da cidade. E falei. Essa música tem muitos signos e Ícones que eu gosto. Tem a ver também com as meninas da Convergência e aqueles valores que tínhamos na esquerda. Ela perpassa por filmes que eu vi e me identifiquei como " As Vinhas da ira", adaptado do livro de John Steinbeck. Gosto desse filme principalmente porque retrata a história do americano pobre expulso da terra pelo grande capital financeiro. Esse capital que corrompe todas as instituições pela ganância transformando o cidadão honesto numa peça da engrenagem do lucro. Cita outro filme que eu adoro: "Noite Vazia", de Walter Hugo Kouri" que, ao contrario das críticas dos engajados no Cinema Novo, foi profético em descrever o silêncio que viria com o regime de exceção e a paranóia do consumo. Tem a questão do olhar: "Minha ilha são as vinhas dessa ira de amar/ alegria e rima que desperta em mim o seu olhar". Usa a metalinguística. Usa "locomotiva de Aqaba a questão sexual colocada no filme. A personagem árabe interpretada por Omar Shariff e o jogo de olhares com o protagonista.
< voltarouvirletrapartitura
Ia se chamar Burana Carmina porque a proposta dela era desmistificar a grandiloqüencia da música clássica e narrar inversão de expectativa. Esta cheia de signos, mas da pra perceber, a referência a uma mulher que tomou um fora do namorado num baile e depois saiu com outra mulher, meio que esnobando o cara. Foi uma situação real que vi na noite.
< voltarouvirletrapartitura
Meu domínio da língua inglêsa e infantil. Também nunca estive em Nova York. Mas essa música veio inteira depois de achar uma sequencia de acordes que gostei. Ela foi feita antes dos atentados as Torres Gêmeas e, no entanto, parece que foi feita depois. Fala na verdade de solidão. E possui um elo com a questão do porto, que está muito presente nas minhas canções. Fala de um rito de passagem e da procura do ser superior. Brinca com a questão do universo interno. O universo mais vasto. O Julinho Bittencourt 5 gostou dessa música.
< voltarouvirletrapartitura
Eu adorei o livro Uma Estadia no Inferno, de Arthur Rimbaud e pretendia fazer uma música sobre ele. O exílio na Abissínia pareceu-me uma história linda e muito triste. Aquele homem num lugar distante, numa cultura tão diferente da sua. O mito solar que ele buscava.
< voltarouvirletrapartitura
Essa letra fala do choque cultural quando da chegada do colonizador. Gosto do fato dela colocar lado a lado o moderno (hi-tech) e essa coisa primitiva que e o Brasil. As questões históricas adormecidas no inconsciente coletivo. Tenta conciliar a mente primitiva e a consciência moderna: "no caminho de Caminha um despacho em cada esquina". Tem a ver com os Tristes Trópicos, do Jean Claude Levi-Strauss. Ou os tais Devassos no Paraíso.
< voltarouvirletrapartitura
Fiz para um amigo meu, o Bira, que estava deprimido por causa de um amor que foi para a Espanha. Meio que tentando tirar ele da fossa, meio que querendo narrar o acontecido mergulhei no assunto. Fiquei Imaginando como seria amar alguém com um oceano separando. Ela possui pormenores que juntei ao contexto dessa idéia inicial. Quando a gravação ficou pronta, eu ouvi em casa, sozinho. chorei muito porque senti a dor real do outro. Absorvi a tristeza que não era minha.
< voltarouvirletrapartitura
Essa música resgata fragmentos de caráter sensório. E não o faz numa linguagem "realista". pois traz dimensões sensíveis de origem subconsciente. A linguagem referencial é a abstração infantil, onde o menino tudo pode. A regra primária da imaginação é não existir censura. Ela é uma brincadeira de criar personagens, que tem a ver com a consciência da "terra devastada". A relação existente com os filmes de guerra que vi na infância. De interpretar personagens de filmes. A identificação do sofrimento humano. Fala desse "navio tatuado em nós". Porque ele está no subconsciente coletivo.
< voltarouvirletrapartitura
Fala da nossa incapacidade de modificar o que entendemos como democracia no Brasil. Esse "sulrealismo" ao qual nos mantemos: a corrupção e a injustiça social, as mazelas pós-ditadura. Baseia-se numa situação real: um grupo de homossexuais foi preso no ltararé sem nenhum motivo.
Levados à delegacia, foram trancafiados com outros presos. Passaram uma noite no xadrez e foram soltos no dia seguinte. Depois de soltos vieram, a saber, que a prisão fora proposital por um motivo: os presos estavam prestes a fazer uma rebelião, por falta de sexo. Então, como era de costume, o delegado de plantão ia as ruas e catava alguns travestis e similares, para acalmá-los.
Na década de 80, em plena epidemia de AIDS essa atitude equivalia a uma pena farda/ matei mendigo/ criança/ pai e mãe/ é coincidencia/ é o destino/ aqui é o Vietnã". Fala dessa autoridade irresponsável. As fraudes existentes no Brasil. O povo brasileiro cansado de intermediar o impossível. Essas atrocidades diárias são obras de anônimos obtusos, dos absurdos existentes no Brasil.
< voltarouvirletrapartitura
Quando eu era criança, no morro do São Bento, brincava num lugar chamado "pedreira". Deve ter uns duzentos metros de altura. Lá podemos ver melhor os navios no porto. De lá, tem-se uma panorâmica de todo o centro de Santos. Muitas crianças iam Iá. Eram muitos os casos de crianças que caiam da pedreira e iam parar no pronto socorro. Então, quando formei uma banda de rock e vivíamos o regime de exceção, achei natural que fizesse uma metáfora. Pois era um símbolo forte. Estar na "Beira do Abismo" era um fato corriqueiro desde criança.
< voltarouvirletrapartitura
Ela narra uma transa num carro. Eu a fiz no teclado. O que não e uma coisa muito comum pra mim. Tem um arranjo, baseado no arranjo original, muito calcado no campo-híbrido. sem a caricatura do subgênero a que muitas canções são submetidas hoje.
< voltarouvirletrapartitura
Curioso o efeito que essa música manifesta nas pessoas. O seu João (o copista das partituras), disse que e uma música depressiva porque fala de suicídio. Mas não e essa a imagem que tenho dela. Fala da depressão dos outros. O eu lírico esta em primeira pessoa, mas e "alguém" falando. Foi um dos períodos mais bonitos da minha vida. Sentia-me feliz. Mesmo quando fala: "Cometa Halley/venha me buscar/ sou um suicida". ela tem um deslumbramento da juventude na descoberta de novos mundos e na disposição de fazê-Io. Os meninos da banda adoravam essa música.
< voltarouvirletrapartitura
Nasceu quando fui gravar o primeiro disco. Eu estava com a banda e os meninos só queriam tocar rock. Eu só tinha rock no repertório. Tive que procurar novos caminhos. Então quis fazer uma música no violão, eu comigo mesmo. Algo que descortinasse a brasilidade e fugisse do assunto comum do sexo-drogas-rock in' roll. Gosto dela porque foi feita de maneira propositada, mas saiu muito natural, como quase tudo que faço.
< voltarouvirletrapartitura
Fiz essa música pensando nas meninas da Convergência", nos militantes em geral. Conta à historia do jovem que viveu o "exílio interno" imposto pela ditadura. Era comum que as pessoas envolvidas com o teatro conhecessem um ou outro militante. Eu vivi bons momentos e conheci pessoas maravilhosas, nessa época. Gosto do clima tenso da letra, a melodia num crescendo, quando as guitarras entram na frase: "Ou de matar o mundo". Da um clima épico. Porque naquela época nós pensávamos, de fato, em mudar o mundo. Que e uma coisa que o jovem de hoje não tem. Essa pretensão. Também me lembra a turma do Sinto e do Tema que tinham peças boas e a mesma pretensão. E fala da ingenuidade da juventude: "O reino podre da juventude".
< voltarouvirletrapartituraNão sei por que lembro do Guilherme Arantes quando canto essa música. Talvez pelo fato de tê-la feito no teclado. Ou lembre da altivez dele quando toca piano. Muita gente gosta dessa música. Ela consegue chegar ao "senso comum".
< voltarouvirletrapartitura
Quando fiz essa música não dei muito valor. Eu mostrei pra j banda e o Ivínho gostou muito. A gente inseriu no repertório. Depois, uma professora chamada Renata, apaixonou-se pela música e, utilizando-se dos estudos de Carlos D. Fregtman, (sobre YIN e YANC), demonstrou que a música era para ela uma mensagem de seu filho (já falecido). Aí fiquei contente. Porque eu acho que a música é uma forma de amenizar o sofrimento das pessoas. E para cada uma terá um . significado. Para mim, ela fala do anjo magoado, da dor do mundo.
< voltarouvirletrapartitura
Essa música esta toda codificada. Essa foi a forma como as vitimas do "exílio interno" imposto pela ditadura aprenderam de se comunicar com o outro. Fala do pânico moral. Ela traz embutidos alguns questionamentos sobre a sociedade burguesa e os seus valores morais. Traça um perfil do clero e da burguesia em situações semelhantes no decorrer da historia. Ela e verborrágica. Possui condicionamentos subjetivos que só nós brasileiros entendemos. Porque fazem parte do nosso pensar diante da barbárie. lnfelizmente ficou muito mal gravada.
< voltarouvirletrapartitura
Decifra-me ou te devoro! Essa música traduz um sentimento de indignação com relação a mentira. Também aborda a essa mistura entre o "eu" e o "nos" e os desdobramentos sociais. Os vínculos afetivos que nos prendem uns aos outros. As responsabilidades pela "beleza que cativas" esta pouco nítida entre as pessoas.
< voltarouvirletrapartitura
Fiz essa música quando tinha um lance com uma pessoa comprometida. Eu fiquei naquela de "Correnteza dividida", meio que gostando meio que achando ruim. É bem Verdade que ela traz uma série de questionamentos sobre fidelidade, mas essa situação nem sempre podemos evitar. O fato de canonizarmos o amor.
< voltarouvirletrapartitura
É uma canção que gosto muito porque coloca o artista como agente transformador da sociedade. A arte como forma legitima de expressão. Sem a grandiloqüência do poder político que filtra tudo. Uma reverencia aqueles que contribuíram para mudar o mundo.
Gosto dela porque foi propositada, no intuito de citar pessoas que eu acho importantes: cineastas, pintores, escritores que são parte da psicologia profunda ou Iideraram revoluções de costumes. Gostei muito da colagem que fiz no encarte utilizando os Sete Pecados Capitais e o Jardim das Delícias, e todas aquelas formas visuais. Ficou lindo. Conceituou o disco. Porque coloca em foco a idéia central: a arte superando o tempo. A letra de Artistas e a _junção dessa temática com as dezenas de possibilidades estéticas fizeram-no meu disco mais conceitual. Entre as gravações e a decisão final do encarte ocorreram os atentados terroristas em 'H de setembro. A decisão de frisar os Sete Pecados contrapunha a liberdade estética ao primitivismo religioso.
Porque as colagens caracterizavam esse fato histórico e tinham um caráter retrospectivo. Essa concepção permitia resgatar esses artistas. como se vários mundos pudessem caber num só mundo, ha um só tempo. Uma coisa que temos e muitas vezes nao nos damos conta: o pensamento que ecoa das obras de arte permanece no inconsciente coletivo. A estruturação do pensamento artístico coloca o gênero humano em evidencia. É conceitua a arte imortal, pois, (essa talvez seja uma visão de quem viveu na ditadura brasileira), o artista sempre reflete na obra as mazelas do seu tempo. Ainda assim. podemos pintar um quadro de Londres no século XVI Il, retratando uma época que não vivemos. A obra existe em outro tempo e. por conseguinte, o artista, viaja no tempo também. lsso se contrapõe a máxima que "a arte acrescenta coisas inúteis". Eu creio que ela não pode ser manipulável, embora tanta gente tente manipula-Ia. A arte ecoa no tempo.
< voltarouvirletrapartitura
Era um bar no Gonzaguinha "onde jovens se reuniam para tocar violão. Geralmente tocavam rock tipo "Angie", do Rolling Stones. Muitas vezes não tínhamos grana para comprar bebidas e ficávamos na mureta da praia em frente ao bar, iluminados pela luz que brotava dele. Daí nasceu a música. Daquela luz que inundava a gente. E da qual nos banhávamos. É uma musica antiga deixada de lado quando eu estava na banda. Ela fala do navio fantasma que assombrava os Jovens. Serviu como um espelho para refletir aquele sentimento de habitar país de absurdo e barbárie.
< voltarouvirletrapartitura
É uma música despretensiosa, mas tem um grupo de acordes bonitos e gostosos de fazer no violão. Trata o amor como algo precioso, que precisa ser lapidado e para o qual devemos nos capacitar.
Gosto muito da frase "É senhor de todo senhor", porque fala dessa mudança que o amor faz na vida das pessoas ultrapassando línguas, fronteiras, como um ato de fé.
< voltarouvirletrapartitura
Fala dessa historia de beijar na boca apenas quem se "ama". Ao contrario do que pode sugerir a letra, eu estava deprimido, nessa. No Solar da Fossa4. pra ser mais exato. Eu fiz essa música pela manhã apos uma transa ocasional de madrugada. Foi uma transa maravilhosa dentro de um amor ruim. Por isso tem aquela frase: "se nos braços de alguém eu fui feliz".
< voltarouvirletrapartitura
Ia se chamar Burana Carmina porque a proposta dela era desmistificar a grandiloqüencia da música clássica e narrar inversão de expectativa. Esta cheia de signos, mas da pra perceber, a referência a uma mulher que tomou um fora do namorado num baile e depois saiu com outra mulher, meio que esnobando o cara. Foi uma situação real que vi na noite.
< voltarouvirletrapartitura
Eu adorei o livro Uma Estadia no Inferno, de Arthur Rimbaud e pretendia fazer uma música sobre ele. O exílio na Abissínia pareceu-me uma história linda e muito triste. Aquele homem num lugar distante, numa cultura tão diferente da sua. O mito solar que ele buscava.
< voltarouvirletrapartitura
Estava especialmente interessado em passar para a música algo que refletisse a Nova Ordem mundial, pós-guerra fria. Os expurgos comunistas, as perseguições aos artistas, a arte. a religião. Foi uma música que veio Inteira, em poucos minutos. Depois de pronta, achei curiosa a semelhança entre determinadas situações: "comunistas no seu cais", tanto expressam a fuga dos chineses para Hong Kong, quando se refere a cidade de Santos no pré-64. Em ambos os casos, a ideologia dividida dos homens. Ambas as cidades localizam-se numa Ilha havendo uma coincidência, uma irmandade, um ambiente de Isolamento. Gosto dela porque trouxe um assunto inusitado num ritmo de axé-music. Lembro-me que pedi ao Edmilson" que acentuasse a percussão.
Mostra a possibilidade de usar um ritmo bem popular numa letra truncada, densa, cheia de imagens, que era a forma como os tropicalistas viam as canções. Em "Pra Chinês Ver" eu acompanhei o processo da feitura do encarte. Fiz a colagem do dragão chinês puxando a torre do Londres de dentro d'água. Não sabia que estava sendo profético.
< voltarouvirletrapartitura
Meu domínio da língua inglêsa e infantil. Também nunca estive em Nova York. Mas essa música veio inteira depois de achar uma sequencia de acordes que gostei. Ela foi feita antes dos atentados as Torres Gêmeas e, no entanto, parece que foi feita depois. Fala na verdade de solidão. E possui um elo com a questão do porto, que está muito presente nas minhas canções. Fala de um rito de passagem e da procura do ser superior. Brinca com a questão do universo interno. O universo mais vasto. O Julinho Bittencourt 5 gostou dessa música.
< voltarouvirletrapartitura
Fiz pra Claudinha, uma menina que gostei. No meio da música pintou o lance de falar da cidade. E falei. Essa música tem muitos signos e Ícones que eu gosto. Tem a ver também com as meninas da Convergência e aqueles valores que tínhamos na esquerda. Ela perpassa por filmes que eu vi e me identifiquei como " As Vinhas da ira", adaptado do livro de John Steinbeck. Gosto desse filme principalmente porque retrata a história do americano pobre expulso da terra pelo grande capital financeiro. Esse capital que corrompe todas as instituições pela ganância transformando o cidadão honesto numa peça da engrenagem do lucro. Cita outro filme que eu adoro: "Noite Vazia", de Walter Hugo Kouri" que, ao contrario das críticas dos engajados no Cinema Novo, foi profético em descrever o silêncio que viria com o regime de exceção e a paranóia do consumo. Tem a questão do olhar: "Minha ilha são as vinhas dessa ira de amar/ alegria e rima que desperta em mim o seu olhar". Usa a metalinguística. Usa "locomotiva de Akabame a questão sexual colocada no filme. A personagem árabe interpretada por Omar Shariff e o jogo de olhares com o protagonista.
< voltarouvirletrapartitura
Essa música nasceu da experimentação de novos acordes no violão. O amor através das palavras. Possui informações sensoriais diferentes de outras músicas minhas. Explora sons e silêncios: uma coisa impensável no rock. Ela foi um divisor de águas na minha composição.
< voltarouvirletrapartitura
Eu fui à Bahia em 1.986 e fique¡ fascinado com a beleza do povo e do lugar. Aclimatei-me rapidinho aos hábitos e sotaques. Impressionou-me, sobretudo, o quanto a música dos Doces Bárbaro descrevia a forma de o povo viver e sentir. Então foi natural que eu juntasse esse sentimento ao traçar o perfil de um amor vivido à época.
< voltarouvirletrapartitura
Fala de amor e desencontro. Essa coisa que gostar de fazer sexo com uma pesca e gostar de conviver com outra. Os desacertos da convivência diária. Esse lance de opiniões diferentes. Eu usei os temperamentos de Rimbaud e Jean Genet" para me referir as desavenças de um casal. A vida de ambos me comovera e imaginei como seria se eles tivessem se conhecido. Então, a música saiu, assim, despretensiosamente.
< voltarouvirletrapartitura
Longe vai o dia que te conheci Na mesa azul daquele bar O sol nublado fez-me distrair Da estranha inocência desse seu olhar Por que será que a ilusão não volta mais
O meu carro, nossa cama sabe Os sinais fechados que atravessei Sua voz surfando pelo vento De um sonho que eu também sonhei
Estou surfando pelo vento Mas já não vejo mais você Sonho é coisa de momento Que a gente sonha sem saber
< voltarouvirletrapartitura
Gosto da ressonância da palavra "tanto". que serve para realçar "tanto viver/ tanto sonhar", porque afirma a brasilidade, a vida aqui nos trópicos, a procura incessante, que e uma coisa menosprezada. Ela é muito bonita porque narra essa busca da felicidade. Tem essa história dos Tristes Trópicos, da boca banguela e o tal terceiro mundo.
< voltarouvirletrapartitura
Cil e Caetano possuem cada qual uma música lindíssima sobre o tempo. Eu acho de fato: " um dos deuses mais lindos". Então pensei em fazer algo a respeito. Fiquei com Isso na cabeça. Fazer uma música legal sobre esse assunto. lsso ficou no subconsciente. Certo dia, Areia velo inteira quando eu brincava no piano. É autobiográfica. Gosto muito da frase: "O principio de tudo areia/ o final desse mundo areia/ areia do mar/ areia". Que lembra a passagem do tempo, a ampulheta de areia e a citação bíblica.
< voltarouvirletrapartitura
Quando eu estava sem banda, compus Disco Voador. Porque precisava treinar composição de melodia e letra. É um resumo do sonho que todo músico tem de gravar um disco, registrar um trabalho para si mesmo, que seja. Ao mesmo tempo, ela (a música) serviu para filosofar sobre a vida. De certa forma para o músico pobre do Brasil, a gravação de um disco é muito difícil. Por que percorre a mansidão invisível do capital na indústria e a visão pragmática nem sempre relacionada a cultura. O mercado é um sorvedouro do capital investido em concepção e divulgação. Mas a música popular transita na linguagem subjetiva do inconsciente coletivo.
< voltarouvirletrapartitura
Tenho muito respeito por essa música. Melhor, devo dizer pelo que ela tirou de mim. Ela tem o mérito de questionar essas coisas que acontecem conosco: pessoas que entram na nossa vida e nos deixam vazios. Porque são pessoas vazias que precisam roubar o melhor de você. Ela aborda esta condição de nos deixarmos levar. De nos esvaziarmos. Fala do homem comum.
< voltarouvirletrapartitura
Eu sofri um serio acidente de carro e precisava comemorar o fato de estar vivo. Então ela e uma música "pra cima". Pra comemorar a vida. Tanto e assim, que em contato com um empresário chamado Fernando Pureza, de empresa que pretendia organizar um disco com vários músicos independentes, essa música me representou. O disco de fato foi feito. Foi engraçado ver o disco empacotado como brinde de natal entre duas garrafas de vinho. Foi bacana. Valeu.
< voltarouvirletrapartitura
Tenho um irmão que gosta muito dessa música. Eu também gosto. Ela não diz nada. Deixa tudo por dizer nas entrelinhas. Suas lacunas desenham uma racionalidade interna. Porque ela se nega a dizer, dizendo coisas avultas, colocando palavras soltas da ao ouvinte liberdade se inventar o que foi propositadamente suprimida. Como um diálogo subliminar.
< voltarouvirletrapartitura
Nasceu quando fui gravar o primeiro disco. Eu estava com a banda e os meninos só queriam tocar rock. Eu só tinha rock no repertório. Tive que procurar novos caminhos. Então quis fazer uma música no violão, eu comigo mesmo. Algo que descortinasse a brasilidade e fugisse do assunto comum do sexo-drogas-rock in' roll. Gosto dela porque foi feita de maneira propositada, mas saiu muito natural, como quase tudo que faço.
< voltarouvirletrapartitura
Fala da nossa incapacidade de modificar o que entendemos como democracia no Brasil. Esse "surrealismo" ao qual nos mantemos: a corrupção e a injustiça social, as mazelas pós-ditadura. Baseia-se numa situação real: um grupo de homossexuais foi preso no ltararé sem nenhum motivo.
Levados à delegacia, foram trancafiados com outros presos. Passaram uma noite no xadrez e foram soltos no dia seguinte. Depois de soltos vieram, a saber, que a prisão fora proposital por um motivo: os presos estavam prestes a fazer uma rebelião, por falta de sexo. Então, como era de costume, o delegado de plantão ia as ruas e catava alguns travestis e similares, para acalmá-los.
Na década de 80, em plena epidemia de AIDS essa atitude equivalia a uma pena farda/ matei mendigo/ criança/ pai e mãe/ é coincidência/ é o destino/ aqui é o Vietnã". Fala dessa autoridade irresponsável. As fraudes existentes no Brasil. O povo brasileiro cansado de intermediar o impossível. Essas atrocidades diárias são obras de anônimos obtusos, dos absurdos existentes no Brasil.
< voltarouvirletrapartitura